Como explicamos brevemente aqui, o conceito de etnia está relacionado a um conjunto de características socioculturais de uma população.
De acordo com o antropólogo, cientista social e professor congolês-brasileiro, Kabengele Munanga, uma etnia é formada por um conjunto de pessoas que possuem aspectos em comum, como um(a) ancestral, um idioma, uma cultura, uma religião ou cosmovisão - isto é, a maneira subjetiva de ver e entender o mundo, as relações humanas e o papel desses indivíduos(as) na sociedade -, ou morar no mesmo território, por motivos históricos ou mitológicos.
O que reverbera na definição do sociólogo britânico Ellis Cashmore. O autor estabelece que a etnia surge como um fenômeno cultural, em que pessoas se unem ou ficam próximas a partir de experiências compartilhadas, tendo origens e interesses comunitários e, assim, configurando seus próprios costumes, crenças e instituições.
Historicamente, nações foram construídas por etnias, que ainda são ou foram grupos que ocupam ou ocuparam territórios com seus próprios códigos socioculturais.
Uma nação é formada quando raças ou etnias estabelecem uma comunidade de origem e passam a reivindicar um destino político comum, relativo aos assuntos públicos daquele grupo, define o cientista social, sociólogo e professor brasileiro, Antônio Sérgio Alfredo Guimarães.
Nesse sentido, a dimensão histórica é bastante importante. Se pararmos para analisar, é possível perceber que há etnias contemporâneas, ao passo que outras já não existem mais.
Kabengele defende que uma etnia não é, por assim dizer, uma "obra fechada", estática. Em certa medida, a única coisa estática é a sua origem. Já a sua história é viva, contínua, tem uma evolução no tempo e no espaço.
A população branca, negra, indígena ou amarela contém nela mesma diversas etnias, que compõem esse conjunto maior denominado como tal, de acordo com as definições de raça, baseadas nas características físicas e biológicas do ser humano.
No entanto, é importante lembrar que o racismo, fenômeno estrutural e estruturante da sociedade, que consiste na discriminação baseada em percepções sociais pejorativas, associadas à pigmentação da pele, traços faciais, textura do cabelo, origem étnica e outras características físicas, privilegia a população branca em detrimento das outras.
Entenda o racismo estrutural no BrasilSob essa perspectiva, por conta do privilégio colocado em ação, o que deu forma à pirâmide social, pode ser comum deduzir que a população branca pertence a uma mesma cultura ou etnia, independentemente de suas diferentes origens geográficas e culturais. O mesmo acontece com a população negra. Mas não é bem assim.
Tendo como exemplo o Brasil, você conseguiria definir uma única cultura branca ou negra? No artigo "Uma Abordagem Conceitual das Noções de Raça, Racismo, Identidade e Etnia", Kabengele exemplifica as diferenciações étnicas do nosso país.
Segundo ele, entre os(as) afro-baianos(as), mineiros(as), maranhenses e cariocas, por exemplo, cada grupo produz códigos próprios, portanto diferentes um dos outros, ainda que haja possíveis semelhanças, no campo da religiosidade, da música, da culinária, da dança, das artes plásticas e assim por diante.
Assim como as comunidades quilombolas, que possuem histórias, culturas e religiões diferentes. Descendentes de italianos(as), portugueses(as), espanhóis(las), e demais povos europeus no Brasil, podem preservar hábitos alimentares e costumes semelhantes aos de seus povos originários.
Do Oiapoque ao Chuí, como diz a famosa expressão, há diversas peculiaridades culturais que vão desde danças, trajes, hábitos, músicas, dialetos, entre tantas outras. Tudo isso diz respeito à etnia - veja no infográfico abaixo dados sobre as diferentes etnias no Brasil.
Como a identidade cultural se constrói com base na tomada de consciência das diferenças, provindo das particularidades históricas, culturais, religiosas, sociais, regionais, etc, se delineiam assim no Brasil diversos processos de identidade cultural, revelando um certo pluralismo tanto entre negros(as), quanto entre brancos(as) e amarelos(as), todos(as) tomados(as) como sujeitos históricos e culturais, e não como biológicos ou raciais.
Kabengele Munanga, antropólogo, cientista social e professor
Quando falamos em território, nem sempre pessoas de uma determinada etnia conseguem permanecer em sua localidade de origem. É o caso de pessoas em situação de refúgio.
O levantamento "Refúgio em Números" (2021), do Observatório das Migrações Internacionais, em parceria com o Conare (Comitê Nacional para os Refugiados) e o Ministério da Justiça e Segurança Pública, afirma que, nas últimas décadas, discutir a mobilidade humana internacional é algo que assumiu protagonismo prioritário na agenda política global.
A América Latina tem desdobramentos evidentes deste cenário e, em especial, o Brasi - veja dados sobre essa população no infográfico abaixo. Conflitos armados, violações de direitos humanos e outras situações de violência são alguns dos motivos que levam essas pessoas a cruzarem as fronteiras de seu país de origem ou de residência habitual.
Então, é importante lembrar que pessoas em situação de refúgio não estão em países outros por uma vontade própria, mas por uma pressão de força maior, buscando proteção em outro Estado, e levando consigo os hábitos e costumes que configuram a sua etnia.
O acolhimento, a compreensão e o respeito a essas pessoas são sempre bem-vindos. Buscar entender sua história e o motivo pelo qual ela está ali leva a empatia a outro patamar.
Se essas pessoas estão próximas ao seu bairro, por exemplo, que tal apresentá-lo para elas, mostrando os recursos básicos disponíveis pela região, como supermercados, hospitais e farmácias?
Bem como ajudá-las a encontrar organizações que ofereçam meios a fim de potencializar a sua reinserção no mercado de trabalho? A exemplo do Instituto Adus e a Toti Diversidade.
Entre a população indígena brasileira, há em torno de
305 etnias
que falam ao menos
274 línguas
Fonte: IBGE, 2016, com base no Censo 2010Pessoas que residem em áreas indígenas e quilombolas
Segundo o IBGE (2021), estima-se que o número de pessoas que moram nessas localidades corresponde a:
1.108.970
Em territórios indígenas, nas regiões:
Destacam-se os seguintes estados:
Amazonas 284.487 pessoas Pará 105.320 pessoas Roraima 83.727 pessoasDestacam-se os seguintes estados:
Pernambuco 80.318 pessoas Bahia 39.926 pessoas Ceará 29.444 pessoasDestacam-se os seguintes estados:
Mato Grosso 145.279 pessoas Mato Grosso do Sul 78.062 pessoas Goiás 343 pessoasDestacam-se os seguintes estados:
Rio Grande do Sul 27.340 pessoas Paraná 19.301 pessoas Santa Catarina 13.254 pessoasDestacam-se os seguintes estados:
Minas Gerais 15.900 pessoas São Paulo 7.505 pessoas Espírito Santo 4.838 pessoas1.133.106
Em localidades quilombolas, nas regiões:
Destacam-se os seguintes estados:
Pará129.770 pessoas Amapá 8.617 pessoas Amazonas 8.563 pessoasDestacam-se os seguintes estados:
Bahia 268.573 pessoas Maranhão 170.961 pessoas Pernambuco 54.411 pessoasDestacam-se os seguintes estados:
Goiás 20.465 pessoas Mato Grosso 12.802 pessoas Mato Grosso do Sul 1.760 pessoasDestacam-se os seguintes estados:
Rio Grande do Sul 54.631 pessoas Paraná 9.631 pessoas Santa Catarina 8.791 pessoasDestacam-se os seguintes estados:
Minas Gerais 130.812 pessoas Espírito Santo 15.993 pessoas Rio de Janeiro 14.857 pessoasImportante: Estes dados não correspondem à totalidade da população indígena e quilombola. O IBGE destaca que o levantamento foi produzido em 2020 - e divulgado em 2021 -, a pedido do Ministério da Saúde, a fim de planejar ações de enfrentamento à pandemia de Covid-19 para grupos vulneráveis. O número total dessas populações será divulgado no Censo 2022.
2019
Foi o ano em que o Brasil recebeu o maior número de solicitações de reconhecimento da condição de refugiado(a), desde a regulamentação do estatuto do refúgio pela legislação brasileira, em 2011, totalizando
82.552 solicitações
Em 2020, foram
28.899 solicitações
O relatório "Refúgio em Números" aponta que a pandemia influenciou diretamente a queda brusca neste número entre 2019 e 2020, devido às severas restrições de mobilidade humana internacional. Mesmo diante de um cenário pandêmico, o número deste último teve um aumento de 1.872%, se comparado ao de 2011 (1.465).
113 países
Foi o número total no que diz respeito à nacionalidade das pessoas que solicitaram reconhecimento da condição de refugiado(a) no Brasil, em 2020, ou ao país que residiam habitualmente, dentre os quais, destacam-se:
Refúgio em Números, 6ª Edição. Observatório das Migrações Internacionais; Ministério da Justiça e Segurança Pública / Comitê Nacional para os Refugiados, 2021
Dimensionamento Emergencial de População Residente em Áreas Indígenas e Quilombolas para Ações de Enfrentamento à Pandemia Provocada pelo Coronavírus. IBGE, 2021
'Dia do Índio': estudo revela 305 etnias e 274 línguas entre povos indígenas do Brasil (com dados do IBGE). BBC, 2016
Classificação de raça/cor e etnia: conceitos, terminologia e métodos utilizados nas ciências da saúde no Brasil. Monique Miranda, 2010
Uma Abordagem Conceitual das Noções de Raça, Racismo, Identidade e Etnia. Prof. Dr. Kabengele Munanga (USP), 2003